sexta-feira, outubro 29, 2004

um mu
- o começo
parte i


talvez devesse começar pelo meu nome, a única palavra que se não me explica ou qualifica, ao menos me identifica dentre os meus pares. E ainda assim, nem tanto. Pois como quase todo nome ele não é nem um pouco exclusivo. É até ordinário, o que terrivelmente - e ironicamente - acaba por me qualificar um pouco sim. Meu sobrenome vem de uma antiga linhagem de homens da qual eu não pertenço. posto que sobrenomes ainda assim são nomes e o meu, mais uma vez, é ordinário. Talvez então sejam meu nome e sobrenome apenas palavras supérfluas dessa autobiografia que teria que ao menos falar algo de mim. O que sei é que meu nome e sobrenome não me pertencem, assim como tantas outras coisas, e portanto não preciso menciona-los.

Talvez devesse começar pelo começo de tudo, da minha vida. Mas como começar assim se nem ao certo dá para estabelecer quando minha vida começou? Porque a ciência ainda não estabeleceu um consenso de quando a vida começa e não sou eu quem vai sugerir algo. A data de meu nascimento tampouco dirá algo pois é ela meramente figurativa. O eu de um dia antes de "nascer" era completa e absolutamente igual ao eu de um dia depois, trocando apenas o amparo do útero materno pelo amparo de panos secos num berço. A data exata nada diz de mim pois é uma data como todas as outras. Não fui o único a nascer nesse exato dia e hora, e nos anos anteriores e nos que virão, não serei eu o único a ter nascido. morte, guerra, impérios temporários, genocídios e cantores de roque podem dividir comigo essa data como de alguma importância - caso eu desse alguma. Nada diz de mim então. E isso se eu considerasse o dia em que fiquei fisicamente livre no mundo como o dia em que nasci. As pessoas só nascem anos depois do parto, isso é um fato.

Talvez devesse então começar a historia de minha vida falando da vida dos outros. sendo que é quase absurdo descrever uma pessoa falando de outras diversas dela, mas talvez disso se pode tirar alguma coisa. Então eu abro espaço aqui para falar dos meus pais, não digo por serem os mais importantes na formação do que sou. Também não digo que eles não o foram, mas como em toda e qualquer pessoa, são os pais - e aqui digo biológicos ou não - quem estabelecem o primeiro contato com o ser vivo que veio ao mundo. Meus pais então...

...Bem no começo do caminho de tentar me escrever encontro a minha primeira barreira. Se eu não consigo nem ao menos começar a ME descrever, como poderei então falar de outras pessoas tão diversas de mim, que infelizmente pouco conheço? Poderia dizer - quase que propositadamente a meu favor - que eles foram ou são bons pais. Mas isso diz tanto quanto nada, pois quase como é regra que bons pais geram bons filhos, eles igualmente geram pessoas horríveis. Isso é mais um fato. Mas se há algo importante que eu descobri de mim no meu relacionamento com meus pais foi que com eles que descobri a cisão e a frustração que tanto fazem parte de minha personalidade. E olhem que não digo isso negativamente. Qualquer aprendizado, por pior que seja, é um aprendizado. É paradoxal e certamente levemente imbecil, mas por mais negativo que seja, todo aprendizado é positivo.


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