sábado, julho 01, 2006

little secret tremors

apertou as bochechas quentes com as mãos geladas como que fosse calar a voz que já não saia da boca. olhou os dedos e estava mesmo tremendo, não que não sentisse isso, mas checava com o olhar para se certificar que sim estou tremendo. não era frio, não era nervosismo, era talvez o excesso de coisas no seu corpo. ou talvez fosse o frio, as mãos estão geladas. ou o nervosismo, o quão paranóico se consegue ser quando se é paranóico? era também o excesso de coisas consumidas. a nicotina. o álcool. a confusão. estava na hora de se fazer uma pergunta, mas a pergunta não vinha. não que não viesse também a dúvida, essa já estava lá desde sempre. mas A pergunta não vinha. e não viria nem para ele, nem para o Outro. não que a resposta estivesse nele ou no Outro, mas se existem perguntas existem respostas em algum lugar. o algum lugar o preocupava, nele ou n'Outro, o algum lugar sempre o preocupava. mas o que não o preocupava? o preço dos cigarros talvez. estava muito caro, mas sempre se arrumava dinheiro. não era o preço dos cigarros, os cigarros nunca faltam quando realmente se procura. não era o Outro olhando-o a noite toda. o Outro sempre o olhava, mesmo quando olhava apenas para não o ver e sim para manter um contato. o olhar é monossilábico mas pluri-interpretativo. o olhar não diz nada quando não se quer que ele diga algo. Algo. ou qualquer coisa. as mãos geladas tremiam e era o cigarro, apostava. mas como num teste acendia outro. outro. outro. outro. a mão continuava tremendo, a ciência dizia. era o cigarro. apertava as bochechas quentes com as mãos frias. o tremor parava. era o cigarro, pensava. mas não parava. apenas o conforto das bochechas quentes dava o apoio suficiente para que a mão parasse de tremer. como se o tremer não fosse o cigarro, e era o cigarro. como se o tremer fosse a hesitação de cada dedo da mão se equilibrando para manter-se ali. em algum lugar. longe do Outro. ou perto de si e das bochechas quentes. como se cada dedo fosse cair em algum lugar. no chão. no bolso. no pescoço do Outro. como se cada dedo se equilibrasse numa corda bamba na mão. era o cigarro. só podia ser o cigarro. o Outro ainda estava lá. mas ainda era o cigarro.

apagou o último cigarro numa poça d'água. saiu sem deixar vestígios em ninguém.

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