quinta-feira, dezembro 11, 2008

como a juba de um leão


a gente constrói coisas e monumentos e edifícios dos mais altos e mais altos e alcança o céu e cobre o céu de cinza e esconde o céu com edifícios e monumentos e então o que é bonito é ter mais e mais e cada construção e cada tijolo e cada pedaço de coisa de cimento e cal e pedra e mármore de carrara, cada pedaço de edifício e de monumento, cada coisa que a gente constrói pra encobrir o céu, cada uma delas não vale um fôlego de vento. uma mão molhada no rio. o sol quente nas costas. uma folha de qualquer planta verde. você, você, você. um beijo e um eu te amo.

quero um coração no rio, um coração no mar, um coração em qualquer massa de água ou lençól freático, e quero que tudo desague em você.

quinta-feira, novembro 06, 2008

shady lane

a shady lane... everybody wants one
a shady lane... everybody needs one
oh my god, oh my god, oh my god, oh my god
oh my god, oh your god, oh his god, over god
it's everybody's god,
it's everybody's god,
it's everybody's god,
it's everybody's god,
the worlds collide,
but all that we want is a shady lane


procuro a lua e não encontro. serve a luz de um poste por detrás de folhas espinhos e galhos. mas a luz amarela ofuscante quer fazer meus olhos fugirem e nem de perto substitui a luz da lua alva ou inspiradora para alguém mais dado à esses caprichos de inspiração poesia ou beleza de alguma noite escura um cigarro algo para ler solidão. e não serve a luz de um poste que mancha de amarelo doentio a visão e a noite e esconte as estrelas para mostrar a rua uma moto passando um vigia apitando numa bicicleta. esconde as estrelas para mostrar o chão de cimento quebrado. esconde as estrelas e substitui a lua. esconde o céu as estrelas e a inspiração para lançar sombras por detrás de folhas espinhos e galhos e a sujeira da rua e a fumaça de cigarro que alva e menos inspiradora sobe em direção de algo que se assemelha à noite mas que pode ser apenas um começo de dia ou um momento antes de se dormir ou apenas o final do turno de um vigia apitando numa bicicleta. porque de tudo vivo o que mais se assemelha à estar vivo é a luz de um poste mostrando folhas espinhos e galhos. dizer que está sozinho é uma afronta à grande realização humana à luz elétrica e à classe dos seguranças noturnos.

se na vida quem perde o telhado em troca recebe as estrelas apenas um poste pode ofuscar o pouco que se ganha.

quinta-feira, outubro 23, 2008

眼睛 ou 早晨好太陽,早晨好生活

10:40. acordava, mas os olhos permaneciam fechados. sabia que do lado de fora havia luz. mas parecia que manter os olhos fechados impediria que os sonhos escapassem. como se pelos olhos aquelas imagens fugissem. ah, os olhos. do lado de fora certamente havia luz, mas as pálpebras eram mantos negros e pesados. não impediam os sonhos de fugir, já era tarde. abria os olhos e olhava, como se isso não fosse natural e impossível de impedir. olhava e via tudo embaçado - o nome científico era miopia e astigmatismo. pensava por três segundos - o que em tempo de pensamento é uma eternidade. olhava e via tudo embaçado e pensava por três segundos porque seu sonho tão real e vívido e tão desembaçado de tudo onde podia voar correr amar ter tudo ou nada e flutuar ou respirar na água, porque aquela imagem tão nítida de cores tão fortes, porque aquilo que escapou dos seus olhos ou ouvidos ou do primeiro respirar de quando se acorda, porque aquilo não era e o que era era aquela imagem borrada de si mesmo da janela da persiana de alguma coisa que reconhecia mesmo sem ver no seu quarto? porque o que era era a imagem desfocada, sem os contornos e as cores e sem as certezas? porque o que era era aquilo que ele reconhecia mesmo sem ver? se acordasse em timbuktu, o que era seria estranho, não reconheceria nada. pensou por meio segundo e viu que em tumbuktu tudo lhe é estranho. mas ainda assim, tudo que não é o que ele reconhece sem ver, porque isso era o que era e não o seu sonho onde podia voar correr amar ter tudo ou nada e flutuar ou respirar na água e ter uma casa com ela um macaco e um gato chamado rex? porque ver de verdade lhe tinha sido arrancado do rosto ou dos olhos ou dos ouvidos ou do primeiro respirar de todos os dias?

10:40. acordava, os olhos e as mãos procuravam os óculos. o despertador. o remédio. engolia com a água que deixara descansar a noite ao lado da cama. olhava pela janela e de uma persiana via a luz que entrava em feixes paralelos. bom dia sol. bom dia vida.

quinta-feira, junho 26, 2008

shithappens

você pegava uma cadeira e botava na rua de costas pra janela. de frente pra rua que em nada havia vida de cidade e de gente e de coisas. só uma cadela manca latia longe mas talvez nem passasse em frente. botava a cadeira na rua de frente pro mundo que não acontecia em sua frente. de costas pra um mundo que não acontecia as suas costas. e do alto talvez um avião. talvez cheio de passageiros e malas. talvez descesse do céu em chamas de frente pra rua. de frente pra cadeira. de frente. e o avião caísse em chamas e explodisse enorme bola de fogo e fuligem e pedaços de coisas vivas e mortas. de frente. e você morre. e morrem juntos noventa e dois passageiros cinco tripulantes. noventa e nove vidas se contarmos a cachorra manca que não conseguiu correr. nem chegariam à cem. dezessete primos de alguém. quinze pais e mães de mais outros que chorarão daqui a algumas horas em frente à tv. quase todos só filhos de mães vivas e mortas e pais vivos e mortos que choram sim ou não em frente à tv. um ou dois malditos filhos de chocadeira porque a morte não escolhe caráter. quatro ou cinco funcionários do mês de alguma empresa que não liga muito pra eles. uma aeromoça bonita que dois vôos atrás se chateou com alguém que não morreu dessa vez. três cardíacos e um epilético. um que talvez fosse diabético. tinha três barras de chocolate no estômago que viraram cinzas junto com ele. uma cachorra manca que não conseguiu correr e uma gata persa que dormia em uma caixa do lado de malas e malas de histórias. laptops importantes. cds piratas. bijouterias. fotos e máquinas fotográficas. histórias e presentes. um violão no qual alguém conquistou outra pessoa que no futuro choraria. ou que apenas acreditaria nisso como aqueles que acreditariam nas 4 bíblias que queimariam depois de largadas na bagagem.

dez segundos antes da queda você sentado de frente pra rua o avião em chamas. setenta segundos antes da queda você sentado o avião caindo. trinta minutos antes apenas pessoas. dois minutos depois apenas números. três horas antes despedidas ou esperanças de chegadas. quarenta minutos antes alguns dormiam e esperavam. outros esperavam e sonhavam. outros apenas bebiam refrigerante ou água ou os dois ou nenhum. quinze segundos antes da queda o som do mundo caindo era apenas um avião caindo e você sentado de frente pra rua olha para o lado e vê. é um avião caindo. você vê o avião e você está sentado de frente pra rua. a cachorra manca não possui quatro patas plenamente funcionas mas um olfato cerca de duzentas e dezessete vezes mais poderoso e já antes sente o cheiro de querosene metal gente sonhos e histórias queimando e o barulho do mundo caindo e era só um avião. a cachorra manca tenta correr. você vê o avião e fecha os olhos. dez segundos antes da queda você sentado de frente pra rua o avião em chamas.

ou então noventa e oito segundos antes da queda o avião em chamas você sentado em uma cadeira de frente pra rua. arruma os chinelos. levanta a calça. faz uma dança da chuva. arrasta poeira e pedrinhas e chinelos pelos chão e os deuses da chuva ou do sol ou da água que cai na terra ou das lágrimas do céu ou tupã. ou jeová. ou teotihuacan. ou o santo deus gravidade humidade relativa do ar ionização. ou o santo deus deus dos judeus javé jesus e maria e o menino jesus e o espírito santo. todos juntos ou separados em cada gota fazem chover. e chover e chover como deuses fazem quando querem. 70 segundos antes da queda e você dança para os deuses e deusas que te ignoram e te atendem o desejo. porque uma dança da chuva só existe se houver chuva e sempre assim haverá de ser. e os chinelos já não arrastam porque planam. porque boiam. porque afunam em água que desce do céu e na terra encontra descanso. e as ruas se enchem e a cachorra manca talvez morra por ser manca e não saber nadar, porque nem sempre toda história é sempre feliz. e enquanto você nada a dança da chuva golfinhos nadem ao seu lado. ou peixes ornamentais. ou o beta em seu quarto. e quinze segundos antes da queda e o avião pousa suave. como um navio que voltava de um passeio no céu. vinte e sete mortos mas menos mães filhos primas chefes e funcionários chorando no outro dia. caso isso importe. e os golfinhos saúdam os vivos menos ou mais destroçados. ilesos e milagreiros. o seu peixe beta encontra a liberdade temporária de uma rua. que é menor que o oceano mas enfim. vinte segundos depois da queda e você bóia em volta de destroços e malas e histórias. na mão uma marguerita com guarda-chuvinha e uma azeitona. a cabeça em cima de um corpo que bóia. feliz e triste por salvar vidas e não salvar outras vinte e sete. como se tivesse os matado também junto com o deus da gravidade. mas a culpa não era dele. e os golfinhos faziam piruetas no ar e o céu era lindo como uma tarde misticamente chuvosa pode ser.

ou então cento e trinta e sete segundos antes da queda o avião não vai cair e talvez por um atraso chegue atrasado ao seu destino. ou não. mas cento e trita e seis segundos antes da queda que não aconteceu você sentado em uma cadeira de frente pra rua. de frente pra rua que em nada havia vida de cidade e de gente e de coisas. de costas pra janela que em nada pareça cidade e gente e coisas. você sentado em sua cadeira e nada acontecendo no mundo dentro e fora de você. de cada lado dentro e fora da janela. um carro passa em uma poça de água e você está cheio de lama. a cachorra manca talvez latisse ou perseguisse o carro. e você cheio de lama.


a vida acontece.


quinta-feira, junho 12, 2008

como lego

Basta que do que sinto
Reste algo além do muito
Algo além da voz sua
Basta algo além da falta

e pra cada primeira letra deixo minha última palavra.

domingo, junho 08, 2008

schweingeist

sonhei que fazia faxina em minha casa sempre tão bagunçada. e a grande surpresa que me acometia era descobrir que minha casa era assombrada por um fantasma. o fantasma era visível o tanto quanto é possível para os sonhos, mas ainda assim assumia uma leve transparência, como se fosse preciso frisar que ei, é um fantasma. mas no sonho o fantasma em nada me assombrava, como disse, era uma grande surpresa, como descobrir uma gaveta em um armário que você nunca tinha visto antes. no caso era um fantasma. e por lembrar do armário, minha faxina havia começado por lá e o fantasma como se planasse por cima do meu ombro direito - ou às vezes do esquerdo, mesmo preferindo o primeiro - vigiava e supervisionava minha faxina.

enquanto organizava à maneira de sonho uma gaveta maior do que parecia, encontrava coisas de gaveta que numa faxina tornam-se ex-coisas nossas e encontram um destino que fica entre a lixeira mais próxima ou um despossuído mais longe. e o fantasma por cima do meu ombro lançava seu olhar. ei, esse broche vai jogar fora? mas ele é horrível e eu jamais o usaria. mas foi sua avó quem te deu, e é por isso você fica de lado nos almoços de família. e eu queria jogar o broche fora, mas o fantasma tinha razão. enquanto o broche voltava ao seu lugar de origem o fantasma ainda mantia seu olho clínico por sobre meu ombro direito. ei, e esse vestido, não foi o roberto quem te deu? sim, foi, mas nem nos falamos mais e além do mais o vestido nem cabe mais em mim e está fora de moda. sim, mas quantas vezes você usou esse vestido e quantas vezes você se sentiu bem e bonita com ele? sim, mas isso é passado. mas o passado só tem esse nome por capricho, ele sempre é presente. e eu concordei porque só de ver o vestido lembrei da primeira vez que o vesti e como num sonho - porque o era - eu já me encontrava vestido nele. achei então um álbum de fotos com fotos que nunca tirei. de momentos que vivi ou não. mas nem dei atenção, passei um pano pra tirar o pó e guardei. e não vai sentar e rever tudo isso? não, ué, eu tou fazendo faxina. e o que é rever fotos se não fazer uma faxina de dentro pra fora? não sei se entendi bem o fantasma, mas desisti de argumentar e por fim concordei e passei o resto do sonho vendo retratos. até que notei que o fantasma que me assombrava não demandava a posse de seu domínio, e pelo que eu lembrava, por baixo de minha casa não jazia nenhum cemitério indígena ou qualquer razão outra para que um fantasma a assombrasse. o fantasma não pedia nada, só observava minha faxina e me atrapalhava. fiquei irritada e acordei.

quando olhei pro lado, debaixo da minha coberta, vi o fantasma de novo. só que dessa vez com mais substância e nenhuma transparência. como se vivo e encarnado estivesse embaixo do meu lençol. aí sim eu me assustei. e via que mesmo com todo o escândalo que se pode dar quando se acorda do lado do fantasma que acabara de sonhar, o fantasma do meu lado, feito carne, osso e pulso, ainda dormia e ressonava com um sono tranquilo de quem dorme e sonha. levantei de um salto e corri pro banheiro, porque não há nada que água no rosto não lave de um sono. olhei pro espelho e me vi como nunca tinha me visto acordada. eu era visível tanto quanto é possível ser quando se está consciente, mas assumia uma leve transparência. vi que meus pés no chão também mal tocavam e voltei flutuando para cama que eu já não reconhecia. deitei do lado do corpo que dormia para tentar de novo dormir e sonhar.

mas estando em dúvida quem era o fantasma. e quem era eu.

sábado, junho 07, 2008

carreira solo

Solidão...
Que poeira leve
Solidão...
Olhe, a casa é sua
O telefone chamou,
foi engano...


- alô, aqui é a adriana...
- adriana, sou eu. não sei o que fazer se é que fazer algo é algo que eu possa fazer. mas não sei. não sei o que dizer mas digo porque está entalado aqui. está entalado e querendo sair. cuspo pra fora. desculpa usar o telefone. mas você está tão longe e eu aqui me desesperando. me exasperando também. me desculpa. mas está frio aqui na rua. não tem fila pra usar o orelhão, mas está frio. juro que não vou demorar eu só precisava falar mesmo porque eu estou desesperado. é como se a gente pagasse pra respirar e eu acabasse de notar que acabou o dinheiro na minha carteira. é esse desespero que eu tou falando. meus pulmões cheios de ar mas sabendo que o fim vai chegar e a culpa nem é minha mas é. não desliga. eu juro que é rápido. eu só precisava dizer isso mesmo. eu sei que nem disse nada ainda. mas eu queria dizer. nem que fosse pra saber que você está aí me ouvindo. ainda está aqui entalado, mas já não sei mais. sei que tudo tudo tudo tudo tudo tudo faz falta. e o que quer que bata, dói. desculpa mas tá acabando o meu cartão queria apenas que você me ouvisse. eu só queria que você soubesse que eu...
- ...e não posso atender no momento. deixe sua mensagem após o sinal.



Na vida quem perde o telhado
Em troca recebe as estrelas
Pra rimar até se afogar
E de soluço em soluço esperar


Só (Solidão), de Tom Zé

domingo, abril 13, 2008

lumpenmensch

existe um pedaço enorme de tempo indo embora e as mãos não são bastante para agarrar o que sobra. as migalhas escapam por entre os dedos e o que sobra não só é vazio. mas um enorme vulto. da parte grande que se vai. a vista perde a vista. o som da ida não mais se ouve. o adeus foi dado às costas de alguém que não estava ali por você. o cheiro e o gosto são daquilo que já se esqueceu. mas que sabe que parece ser bom. lembrava ser bom. as migalhas caem por entre os dedos e o tempo escorre por entre as frestas abertas de cada marca deixada. de cada cicatriz aberta. existe um pedaço enorme de tempo indo embora e as mãos estão ocupadas com duas. quatro. oito coisas. malabares de pinos infinitos. jogados pra cima. sem mãos suficientes pra pegar quando vão ao chão. o tempo indo embora e os pinos caindo. as migalhas escapando e o tempo caindo. o vazio indo embora e o vulto de algo que já não se sabe se acomodando. tomando o espaço que um dia foi do tempo que foi embora. e que está indo embora. e que sempre vai embora. sempre foi embora. há sempre de ir embora. e as mãos ocupadas mas querendo dar o adeus às costas de alguma coisa que não está ali por você. as mãos ocupadas tentando segurar o tempo. mas as mãos não são o bastante. e o tempo vai embora. e os pinos vão caindo. e nada acontece. e tudo acontece à sua volta. e não tem como parar tudo e dizer que chega. porque tudo acontece. e sempre acontece. e sempre é agora. e é sempre ao mesmo tempo. e sempre as mãos não vão ser o bastante. não há mãos. pés. olhos. bocas. narizes. línguas. ouvidos. suficientes.

queria ter os dedos por entre os cabelos do tempo. pra carinhar a memória. os dedos sobre os braços do tempo. pra segurar o que vai embora. os dedos no ventre do tempo. pra avivar o calor de tantas estórias. e o tempo vai. os pinos caem. a cortina se fecha. o espetáculo não vai ouvir nenhuma som de palmas. e você está sozinho no escuro.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

daimon

de tantas muitas existe uma voz em mim adormecida que fala quando todas vozes estão roucas de gritar e eu não ouvir. que fala enquanto eu insisto em sonhar, e não dormir. que me engana enquanto conta verdades misturadas ao que lembro, sempre mentiras. essa voz adormecida que me diz que não existe espaço pra espera, mas que sentar e cruzar os braços é tão bom quanto sair pelo mundo e respirar o ar da vida. essa voz que diz que o amor é um demônio que se conjura à um, mas que se exorcisa à dois. a voz que fala de mim como se me visse de longe, mas que está tão dentro de mim que sou eu, vendo alguém que não conheço tão de perto. uma voz que não esquece pois é memória viva, gritando enquanto não ouço, dormindo enquanto eu sonho.

e de nada adianta acordar ou atentar, o que ela fala é um eco em silêncio.



quarta-feira, janeiro 23, 2008

ars est celare artem

tornar-se adulto é um exercício de desaprender a verdade íntima das coisas. adultos mentem o tempo todo, ao ponto de esquecer o que os liga à realidade e a ponto desse exercício tornar-se lugar-comum como ferramenta de interação social. pais mentem o tempo todo, julgando ter a verdade e sua manipulação como um bem ou como um instrumento de poder por sobre sua cria indefesa contra as palavras grandes do mundo. e como criança que fui e não admito ainda poder ser, fui criado em volta das mentiras dos adultos e dos pais. esses que mentiram contra e a favor de si mesmos, entre e intra si mesmos, pra todos, pro mundo e principalmente pra mim. aprendi com a mentira deles pra mim a como mentir pra mim mesmo. aprendi com a mentira deles pra eles mesmos a como mentir a mentira dos adultos. cresci e virei mentiroso como eles, talvez um motivo de orgulho se não fosse uma grande verdade que a mentira é orgulhosa só quando a vestem de verdade por muito tempo. e talvez vivemos um mundo de mentirosos orgulhosos, nenhuma língua conhecida possui o verbo pra dizer a verdade, mas cada uma tem seus vários verbos, gírias e corruptelas pra dizer a mentira. soltar o caô. enganar. trapacear. vilipendiar. calúniar. enrolar. a mentira machuca, mas a verdade mata. crescer dói em cada junta e em cada descoberta.

aprendi com meus pais à mentir pra mim mesmo porque talvez nem tenha sobrado muita verdade num mundo tão cheio de adultos.