quarta-feira, outubro 30, 2002

Parte II

Na tentativa de se anular a ansiedade, certos rituais que fazemos parecem esdrúxulos demais. Mesmo para os que não tem toc.
Tem um caso que eu acho que devia contar aqui. O caso de um menino que eu chamo de “Júnior-cover”.

Esse garoto, quase todos os dia, vai para a o canteiro central da Hermes Fontes, uma das mais movimentadas avenidas de Aracaju, e imita Júnior da dupla Sandy & Júnior por muito tempo.

Quase todas as tardes...

Só essa semana encontrei ele lá duas vezes.Ele se arruma, põe roupas parecidas com as que Júnior usa, coloca um fone de ouvido, e dança as coreografias de Júnior com uma alegria que eu nunca vi, nem no original. Ele dança, anima a “platéia”, ajeita o “microfone”, dá xauzinho pros carros em alta velocidade, acena pras “fãs”entre outras coisas. E quando ele para, ele fica caminhando de um lado para o outro cantarolando algo. Ele caminha muito mesmo. Algo como uns cem metros, indo e voltando, indo e voltando...
E ele deve ser feliz assim. Ele é louco?

Olha, normal ele não deve ser. Mas e as pessoas que precisam que as roupas combinem perfeitamente antes de saírem de casa? E as pessoas que precisam dizer sempre o que as outras querem ouvir, mesmo sendo contra tudo o que elas pensam? E o que é ser normal? O que é ser são? O que é ser realmente feliz?

Raphael, em um sábado dia 12 de outubro, escreveu: “A felicidade nada mais é do que um engodo. Só serve para nos tirar do estado de tristeza, que aparenta ser permanente, e depois nos deixar mais frustrados ainda ao perdermos tudo o que nos deixava feliz.”. Raphael ainda diz mais: A felicidade mesmo não existe. Nem a tristeza. O QUÊ?

Olhe bem, eu estou sendo meio polêmico agora, mas é o que eu sinto no momento. E eu sei que eu vou me desmentir quando eu tentar explicar isso, então ou não leia as próximas linhas ou não escute o que estou falando. Ou melhor, escute, afinal eu tou escrevendo isso pra você.

O que é a felicidade? O que é a tristeza? Se formos muito longe não tiraremos muitas conclusões definitivas então eu digo: Felicidade e tristeza são apenas um momento diferente do mesmo estado de espírito. Que é apenas o estado de estar vivo.

Eu não explicitei muito que elas não existem...Bem o que eu quero dizer é que elas não existem por si só, e não são coisas isoladas e perfeitinhas em si mesmas. Elas são partes. São faces do que é viver. E olha que ta parecendo que eu sou daqueles que tem uma visão da vida bem bonitinha e tal. Eu não tenho.

A vida é, para mim, apenas o estado de se estar organicamente e mentalmente vivo. Ponto.

No spirits, no aura, no nothing else.

”E por que então a tristeza e a felicidade?”

Infelizes concentrações de neurotransmissores em diferentes proporções em nossos cérebros.

“Ah ta, mas é porque é assim?”

Apenas reações do nosso organismo ao mundo externo.

“Sim, mas isso quer dizer que elas não existem?”

Sim. Porque pra mim elas não existem. E viver é sofrer. E não acho isso ruim não, felizmente temos uma capacidade impressionante de nos deliciar com qualquer merreca de felicidade. Por isso que criamos o carnaval. Todos esquecemos de que nos fudemos o ano todo. A gente ainda se fode a tarde inteira pra quando chegar a noite ficar feliz como nunca.

E isso é bom? É ruim? Eu não sei, e se é existe a tristeza e a felicidade, então nós somos tristes.

“Não sei por que o ser humano se esforça para entender o outro, as pessoas são incapazes de se entender completamente. O ser humano é um animal triste”.

Esse blog é muito inconsistente. E eu sou muito inconsistente. Minhas idéias são inconsistentes. Meus ideais são inconsistentes. Minha vida e minhas palavras são inconsistentes. Mas eu tento ainda viver, porque além disso não há nada. Depois disso, só o nada.

Por exemplo, eu começo os meus posts em um assunto, pra sem ainda terminar este ir pra outro. E terminar do nada. E não concluir nada.

Eu estou em processo de desconstrução, e escrever esses posts sem sentido são importantes para mim. Mesmo porque para mim eles tem sim um sentido. Não só sentido como significado, mas sentido como direção. Escrever é uma terapia maravilhosa.

E porque eu escrevi essa segunda parte? Olha, por que eu quero. Eu não contei tudo o que eu queria no post anterior. Mesmo sendo esse uma redundância do primeiro, ele é uma desconstrução em outro nível. E eu não me expliquei direito no meu post anterior.

Olha, quando eu digo que a felicidade não é tão importante assim eu não digo que a felicidade não é importante. Ela é importante sim! Nos ilude por um instante. Nos engana quando estamos tão certo de tudo. E equilibra a modulação das ondas cerebrais. Além de que a felicidade é até certo ponto saudável.

Mas o que eu quero mesmo dizer é que ser feliz O TEMPO TODO não é tão importante. Aliás, é prejudicial. A felicidade tem que ser vista como algo temporário e raro, não como um objetivo de permanência. Se eu sou pessimista? Não. Eu encaro minha vida sob a ótica da minha realidade. A felicidade é um bem raro como tudo que é bom. E ela deve ser vista assim. Sem neuras. Sem perseguições intermináveis. Sem passar por cima do outro.

“eu sinto falta do conforto de se sentir triste”

Imagine se todos aceitassem esse aspecto da vida? Não tou falando em ser um desistente! Longe disso!! A desistência pra mim não tem nada a ver em encarar que a vida é triste sim, não importa se você é feliz por muito tempo. Eu acho que se todos encarassem isso, além de ser um choque no capitalismo, ia aumentar o prazer das pessoas em si mesmas, por conseguinte deixando a vida menos triste.

Peraí. Eu me contradisse?

Não acho não. Eu tenho muita certeza disso agora. Se aceitássemos que somos a maior parte do tempo tristes e que não devemos nos sentir piores só porque não somos felizes o tempo todo como os astros de TV e os ricaços da sociedade que vemos todos os dias na televisão, aprenderíamos mais sobre nos mesmos. Aceitar que nem sempre somos felizes nos deixa menos tristes. Estranho? Experimente.

E onde entra a ansiedade?

Entra nisso tudo. Felicidade, tristeza...et cetera.

A ansiedade é criada porque não podemos ser apenas seres vivos. Temos que ser algo mais. Temos que ser seres humanos superiores aos animais. Temos que ser seres humanos tementes a deus. Temos que ser seres humanos cidadãos e conscientes de nosso papel social. Temos que ser felizes e consumidores ávidos pela felicidade em papel, aço e plástico.

E é por isso que eu decidi me desconstruir no meu blog. E vocês, o que é que tem com isso?
Tem que eu me desconstruo em vocês também. E isso é importante pra mim. Eu não sou eu sem você. Eu sou eu e sou você mais eu. E eu preciso que cada pedacinho meu em você não passe incólume nessa demolição do meu ego. Eu já li em algum lugar que a felicidade total só é encontrada com a supressão total do ego...Me parece mais uma desses hedonistas que só querem saber de surubas monumentais, mas eu não acredito em felicidade total...Nem em surubas.

E eu preciso de vocês também porque só eu lendo isso não adianta. Eu ainda me encontro com muitas pessoas que ainda me conhecem como uma pessoa que eu não sou mais. E reverter é um processo doloroso e imbecil. Eu fico mais e mais ansioso. E triste também...

Eu não tenho nenhuma receita de felicidade...Mas sei que ela passa por tudo isso que eu escrevi agora. E pelo que eu ainda vou escrever...é tudo só umbiguismo puro. E tudo faz sentido pra mim e pra todo mundo que tem um pouco de mim dentro de si. Ah, sim, e todo mundo que é ansioso como eu...

Se a gente pudesse dançar livremente pelo canteiro da mais movimentada avenida da cidade sem se preocupar com os outros seriamos menos ansiosos? Eu não tenho certeza disso, mas sei que Júnior Cover parece bem feliz.

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